08 abril, 2010
0 Quando Vivíamos na Carne - João Calvino
Porque, quando vivíamos na
carne (Rm 7.5,6) Paulo mostra, usando de um contraste ainda mais
vivido, quão equivocados estão os que são zelosos pela lei, pretendendo manter
os crentes sob o domínio dela. Enquanto o ensino literal da lei estiver em
vigor e dominar, sem qualquer conexão com o Espírito de Cristo, a
concupiscência da carne não será refreada; ao contrário, crescerá cada vez
mais. Segue-se deste fato que o reino da justiça só será estabelecido quando
Cristo emancipar-nos da lei. Ao mesmo tempo, Paulo nos lembra aquelas obras que
fazem parte de nossa vida prática, quando somos emancipados da lei. Portanto,
enquanto o homem estiver sob o jugo da lei, não obterá nada para si, senão a
morte que procede do contínuo pecar. Se a servidão da lei só produz pecado, então
a liberdade, que é o oposto de escravidão, se inclina para a justiça. Se a
escravidão nos conduz à morte, então a liberdade nos conduz à vida. Todavia,
atentemos bem para o sentido das palavras de Paulo.
Ao descrever nossa condição
durante o tempo em que estivemos sob o domínio da lei, o apóstolo afirma que
estivemos na carne. Disto entendemos que o único benefício obtido por todos
aqueles que se acham debaixo da lei consiste em que seus ouvidos ouvem um som
externo, mas que não produz qualquer fruto ou efeito, visto que são intimamente
destituídos do Espírito de Deus. Devem, pois, permanecer completamente
pecaminosos e perversos, até que um remédio muito mais excelente surja para a
cura de sua enfermidade. Note-se também a expressão comum da Escritura: estar
na carne - o que significa ser dotado somente com os dons naturais, sem a graça
particular com que Deus favorece seu povo eleito. Se este estado de vida é
totalmente pecaminoso, é evidente que nenhuma parte de nossa alma é
inerentemente pura, e que o único poder que nosso livre-arbítrio possui é o de
exteriorizar suas vis paixões como dardos lançados em todas as direções.
As
paixões pecaminosas postas em realce pela lei. Isto
é, a lei excitou vis paixões em nós, as quais produziram seus efeitos em todo o
nosso ser. Na ausência do Espírito, nosso Mestre íntimo [=interior Magister] a obra da lei consiste em inflamar ainda mais
os nossos corações, de tal forma que nossos desejos libidinosos irrompem em
borbotões. Deve-se notar que Paulo, aqui, compara a lei com a natureza corrupta
do homem, cuja perversidade e concupiscência irrompem com grande fúria, por
mais que seja ele detido pelos freios da justiça. Ele ainda adiciona que,
enquanto nossas paixões carnais se agitam sob a lei, outra coisa não produzem
senão frutos de morte. Paulo assim prova que a lei, por sua própria natureza,
era destrutiva. Segue-se que aqueles que, com ímpeto, preferem a escravidão que
resulta em morte são completamente loucos.
Agora, porém, desvencilhados da lei. Ele dá
seguimento a seu argumento a
partir de opostos. Se a coibição da lei surtiu tão pouco efeito em subjugar a
carne que nos despertava antes a pecar, então devemos desvencilhar-nos da lei
para que deixemos de pecar. Se somos libertados da servidão da lei a fim de
podermos servir a Deus [livremente], então aqueles que derivam deste fato sua
licença para pecar, e aqueles que nos ensinam que devemos soltar as rédeas e
nos entregarmos à luxúria, também estão equivocados. Note-se, pois, que só
somos libertados da lei quando Deus nos livra de suas rígidas exigências e de
sua maldição, dotando-nos com o Espírito Santo a fim de podermos trilhar seus
santos caminhos.
Estamos
mortos para aquilo a que estávamos sujeitos.
Esta é uma parte explicativa,
ou, antes, sugere de que forma fomos feitos livres. A lei, no que nos diz
respeito, é revogada a fim de não mais sermos oprimidos sob seu fardo
insuportável e não sermos encontrados sob seu inexorável rigor a subjugar-nos
com sua maldição.
Servimos em novidade de
espírito. Paulo contrasta espírito e letra. Antes de nossa vontade ser
conformada com a vontade de Deus por meio da operação do Espírito Santo, não
encontramos nada na lei senão a letra externa. Esta, é verdade, refreia nossas
ações externas, porém não pode refrear um mínimo sequer da fúria de nossa
concupiscência. Ele atribui ao Espírito nossa novidade, visto que ela sucede ao
velho homem, assim como a letra é denominada de caduca, já que ela perece ao
ser renovada pelo Espírito.
Labels:
Comentários Bíblicos,
Graça,
João Calvino,
Justiça Pecado,
Nova Vida,
Romanos
Assinar:
Postar comentários (Atom)
0 comentários: